A PAZ ETERNA

Numa obra de autoria medieval, a “Lenda Áurea”, conta-se um interessante fato ocorrido no reinado do imperador César Augusto. Este, depois de ter vencido seus adversários e expandido as fronteiras de seu império – dominando a bacia do Mediterrâneo, e boa parte da Europa, levou a glória de Roma a um auge até então nunca visto. Seu longo governo marcou a história da humanidade não só por suas brilhantes vitórias militares e pelo poder alcançado, mas, sobretudo, pelo extenso período de paz que o mundo civilizado conheceu: a “Pax Romana”.

Ainda hoje, na civilização ocidental, restam vestígios da glória desse reinado. Por exemplo, o nome dado ao mês de agosto: a palavra deriva de Augustus, por ter sido o mês dedicado ao célebre imperador. Houve também cidades do império que tomaram o seu nome, como Cesaraugusta, na Espanha, hoje Zaragoza.

Tão frequentes eram na Antiguidade as guerras, que a pacificação do império, promovida por César Augusto, foi algo extraordinário. Por isso, no décimo segundo ano consecutivo sem guerra, os romanos ergueram um templo à Paz. Mas, receosos de que o novo culto tivesse pouca duração, queriam saber quanto tempo teriam ainda de tranquilidade e foram consultar o oráculo de Apolo. Este, como faz os adivinhos de todas as épocas, deu uma resposta ambígua e enigmática de modo a poder esquivar-se comodamente de futuras reclamações, na eventualidade de resultados desfavoráveis.

Mas às vezes, ou por casualidade, ou por desígnio da Providência, o vaticínio acaba sendo acertado. E foi o que aconteceu nesse caso.

Segundo o oráculo, a paz duraria “até uma virgem dar a luz”. Ora, tal fato era humanamente impossível. Portanto, concluíram os romanos, uma duração indefinida. Bem podemos imaginar sua euforia, na expectativa de poderem usufruir das riquezas, prazeres e comodidades da capital do poderoso império, sem perturbação e por tempo ilimitado. Uma inscrição nas portas do templo consagrava tão feliz previsão: “Templo da Paz Eterna”.

No entanto, conta a “lenda Áurea”, quando Nosso Senhor Jesus Cristo nasceu em Belém, esse templo ruiu de forma inexplicável, ficando reduzido a um montão de escombros. E com a sua derrocada, foram também pulverizadas as ilusões dos romanos, de que a paz duraria eternamente. Mais tarde, nesse lugar, situado entre o fórum e o Coliseu, foi construída a igreja de Santa Maria Nova, também chamada de Santa Francisca Romana.

Nas lendas a realidade e a fantasia se misturam graciosamente, e assim deixam aos ouvintes ou leitores o gosto de conseguir penetrar seus enigmas. Esta lenda, porém, é muito mais real do que parece à primeira vista. Feitas ligeiras adaptações e atualizações, bem poderia passar por uma história verídica de nossa época.

As superstições modernas conceberam inúmeros templos à “Paz Eterna”. Quantas vezes, não registra a história a celebração de pomposos “tratados de paz”, com o objetivo de garantir uma era de paz eterna? Pouco tempo depois, eles se transformam em letra morta e pulverizada, como o velho templo pagão de nossa lenda. Outras vezes, será um templo à saúde física buscada com sofreguidão. Contudo, basta uma doença grave, um câncer, por exemplo, e… o templo vira destroços! Inúmeros seriam os exemplos a serem dados. Entretanto, onde está a “Paz?”

São Beda em uma de suas homilias, nos ensina que “A verdadeira, e única paz, das almas neste mundo consistem em estar cheios de amor de Deus e animados pela esperança do céu, a ponto de considerar desprezíveis os êxitos, e os sofrimentos deste mundo… Se equivoca, quem possa pensar que poderá encontrar a paz nos prazeres e nos bem materiais deste mundo. As frequentes turbações mundanas e o fim deste mundo deveriam convencer a esses de que estão construindo sobre a areia os fundamentos de sua paz.”

Assim, o tempo litúrgico do advento é uma excelente ocasião para meditarmos sobre que paz estamos procurando, pois eis que vem Aquele que é o Príncipe da Paz (Is 9,6), Jesus Nosso Senhor. A paz do mundo é mentira e ilusão. A Paz que de Cristo procede, esta sim é eterna.