Os seis modos de perder tempo
A Santa Igreja nos ensina que o tempo é uma criatura de Deus. Foi constituído para servir ao homem e deve ser administrado de forma a dar glória ao seu Criador.
Deixamos a seguir alguns pontos de reflexão sobre o perigo que todo homem enfrenta: perder tempo.
Procuremos evitar a perda de tempo, pois deveremos prestar contas, no dia do Juízo, do uso que fizemos de cada segundo.
Primeiro modo de perder o tempo
Perde‑se o tempo não fazendo nada. Todas as faculdades na nossa alma parecem embotadas; não pensamos em coisa alguma, não sabemos o que havemos de fazer da nossa pessoa e do nosso tempo; ou se pensamos em alguma coisa é em frivolidades, em vãos projetos, em quiméricos desígnios. Se não temos em que ocupar‑nos, procuramos passar as horas, desde a manhã até a noite, em conversações frívolas, em visitas sem objeto determinado, em passeios, em jogos, em diversões que pode inventar a preguiça, e desperdiçamos todos os nossos momentos.
Segundo modo de perder o tempo
Perdemos o tempo, quando o empregamos em obrar mal. Tal é o pecado dos que gastam o tempo em ler romances, dramas ou outros escritos que pervertem os costumes, em criticar o próximo e a dizer mal dele, em frequentar companhias perigosas, em ir a certos lugares onde a alma está exposta a todas as seduções, em formar projetos de vingança, de ódio, ou contrários à justiça, em ouvir as sugestões de satanás, que insinua maus pensamentos ou maus desejos.
Terceiro modo de perder o tempo
Perdemos o tempo praticando ações indiferentes, isto é, que nada têm de repreensíveis em si nem na maneira como se praticam, mas que se fazem maquinalmente, sem um fim bem determinado, ou com intuitos puramente humanos e naturais. Por exemplo, comer unicamente porque se tem fome ou é a hora de refeição; deitar‑se, porque se deseja dormir; descansar, porque se está fatigado; conversar, porque recreia; ir ver certo objeto raro por curiosidade. Evidentemente tudo isto é sem merecimento, porque é feito sem ter em vista Deus. Que perda e que desgraça! Para tornar digna do Céu uma destas ações que se chamam indiferentes, bastaria uma reta intenção.
Quarto modo de perder o tempo
Perdemos o tempo ainda quando fazemos boas obras, mas que não estão na ordem dos nossos deveres. É o pecado dos que se esquecem de que os deveres do seu estado têm preferência a tudo; que, sem regra na conduta, fazem tudo antecipadamente, e nada na hora determinada; que pensam muitas vezes no que devem fazer e se resolvem quase sempre a fazer o que não deveriam fazer; que dormem, quando conviria que se levantassem; que oram, quando conviria que trabalhassem, ou trabalham, quando deveriam orar.
Quinto modo de perder o tempo
Perdemos o tempo até fazendo boas obras, que estão na ordem dos nossos deveres, e isto pode acontecer de duas maneiras: 1°) Quando estamos em pecado mortal: porque, neste estado, todas as obras são mortas, não meritórias diante de Deus; todo o bem que fazemos pode, sem dúvida, dispor Deus a conceder‑nos a Sua graça para nos convertermos, mas não pode ter nenhum valor para a salvação; 2°) Quando fazemos boas obras por vaidade e ostentação para nos distinguirmos e obtermos a estima dos outros, em vez de as referirmos a Deus; quando fazendo o bem, por exemplo, uma esmola a um pobre, somos movidos somente por um sentimento puramente humano, uma comiseração puramente natural.
Sexto modo de perder o tempo
Finalmente, perdemos o tempo ainda fazendo, com reta intenção, o bem que está na ordem dos nossos deveres, quando o não fazemos no tempo, lugar, da maneira e com as demais circunstâncias que Deus exige de nós. É o que sucede com certas pessoas que não fazem bem o bem, que o fazem de má vontade, em tempo e lugar inoportunos, sem fervor e aplicação de espírito, sem ser por amor de Deus e de Sua glória, e com outras imperfeições que não tratam de remover. Nestes casos, os merecimentos perdem‑se, ou pelo menos se diminuem. Que vasta matéria de exame de consciência! [1]
[1] H. Hamon, Meditações para todos os dias do ano, Lello e Irmão editores.
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