São Francisco de Assis: Esplendor e riqueza para Deus?

Ao considerarmos a história da Santa Igreja Católica, podemos compará-la a uma bela planta em contínuo florescimento. De maneira tal que, quando atingir sua estatura perfeita, tiver exalado todo o seu aroma e resplandecido com todo o seu esplendor e beleza, aí então no fim do mundo, ela será colhida por Deus. Devemos, portanto, conceber que nesse seu inteiro desabrochar, a Igreja manifestou, e ainda manifestará tudo quanto nela existe de formosura e de expressões de santidade ainda não externadas, além de aprimoramentos e requintes do que ela engendrou ao longo dos séculos.

Pensemos, por exemplo, em uma de suas mais belas flores: São Francisco de Assis. Suscitado pela Divina Providência para escandalizar o mundo pelo exemplo impressionante de uma pobreza intransigente, quando, na Idade Média, a Civilização Cristã ameaçava desviar-se dos seus rumos pelo exagerado apego dos homens ao dinheiro e aos prazeres do mundo. E a experiência demonstrou que o melhor meio de abater qualquer vício consiste em lhe opor o exemplo completo e radical da virtude contrária. Neste nosso século simplório, argentário e sem beleza, em que o culto aos interesses e egoísmos dos indivíduos parece ser o único padrão pelo qual se medem todos os valores humanos, o exemplo de pobreza e desprendimento heroicos dado pelo pobre de Assis tem um perfume evangélico que não se pode perder.[1] Mas, que despretensão e pobreza veio trazer São Francisco?

Ora, o poverello de Assis viveu humilde e pobremente, desprendido das glórias mundanas e dos conceitos alheios a seu respeito. Todavia, no que se referia a Jesus Eucarístico, reprovava com radicalidade todo e qualquer relaxamento com que muitos celebravam os Sagrados Mistérios. Em uma de suas cartas aos sacerdotes, São Francisco os exortava a que honrassem sobre todas as coisas o Santíssimo Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo. Não obstante, insistia ainda que os cálices e corporais, ornamentos do altar e tudo quanto se referia ao Santo Sacrifício deveria ter coisas preciosas. E àqueles que encontrando o Santíssimo Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo conservado de modo inconveniente ou simplesmente deixado em alguma parte, que o tirassem de tal lugar para colocá-lo e encerrá-lo num lugar ricamente ordenado.[2]

Quem, que ao acompanhar a celebração de uma Missa solene, admirando os reluzimentos dos objetos sagrados, o perfume do incenso, a coruscação dos tecidos bordados a ouro, os paramentos eclesiásticos, as maravilhas de que se revestem os ritos e a liturgia católica, seus simbolismos e mistérios, não percebe ali que a Igreja exprime algo além dos seus dogmas já definidos? Sim, São Francisco, o pobre de Assis, percebia, e não só percebia, mas amava e exortava os seus discípulos que fizessem o mesmo.

O senso do Sagrado unido ao maravilhoso é algo que possui profundo vínculo com o amor a Deus, pois se trata de um meio superiormente apropriado para conduzir as almas ao desejo das coisas celestes. Em outras palavras, Deus criou maravilhas para elevar o homem até Ele. Outro exemplo: ao contemplarmos um lindo pôr-do-sol, é-nos dada a oportunidade de louvar, de modo especial, ao Criador. Daí a razão pela qual São Francisco de Assis cantou o “irmão sol”. O maravilhoso é a arte produzida por Deus para externar a sua infinita grandeza aos nossos olhos. Porém, o nosso maravilhamento deve ter as belezas naturais apenas como ponto de partida e, muito mais e a perder de vista, pousar sobre as coisas sagradas, seus simbolismos e significados.

Daí as firmes palavras de São Francisco, visto que sabemos e que temos que observar tudo isso em primeiro lugar, de acordo com os preceitos e recomendações do Senhor e as constituições da Santa Mãe Igreja. E quem não fizer isso, saiba que deverá prestar contas severas perante Jesus Cristo no dia do juízo.[3]

Assim é que entre o desapego e pobreza que devem caracterizar cada católico, sobretudo os ministros ordenados, e o esplendor do Culto e a beleza e dignidade dos templos sagrados e paramentos litúrgicos, não existe nenhuma contradição. São, pelo contrário, extremos opostos que se equilibram de forma prodigiosa, como afirma com todas as letras o próprio Esposo da Dama Pobreza. Eis aí o verdadeiro espírito de São Francisco e que deve perdurar até o fim do mundo: pobreza para os homens, mas para Deus toda riqueza, honra, glória e poder por todos os séculos dos séculos. Amém.[4]


[1] CF. CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. In: Legionário, nº 578, setembro de 1943.

[2] Cf. São Francisco de Assis. Primeira carta aos Custódios. In: Escritos. Braga: Franciscana, 2001.

[3] Cf. Opus Cit.

[4] Cf. Ap 5,13