A primeira cura em Lourdes

Lourdes continua fascinando o mundo!

Há pouco tivemos a oportunidade de publicar o mais recente milagre realizado por Nossa Senhora em Lourdes. Hoje trazemos a primeira cura nas águas milagrosas da Gruta de Massabielle. A narração é feita por Ruth Cranston, jornalista americana protestante. Na década de 1950, Ruth viajou a Lourdes e a outros locais da França, pesquisando os milagres de Lourdes, a partir do que ela descreve como “uma curiosidade irreprimível”.

Escreve ela logo no início de seu livro: “Durante anos estive interessada no poder da fé religiosa no alívio dos males humanos, e fiz um estudo especial a respeito. Visitei muitos centros de cura na América e outros países, pesquisando diferentes métodos e teorias. Mas até recentemente sabia muito pouco a respeito de Lourdes, se bem que haja passado boa parte da minha infância na França. Mas naquele tempo não estava interessada nessas coisas. Então veio aquela manhã radiosa quando li uma nota no jornal, que me emprestara um amigo francês: ‘Criança idiota curada em Lourdes. Menino com sete anos recupera a inteligência depois de viver durante três anos como animal’. Notícias de outras curas se seguiam: câncer no estômago, peritonite, fratura de osso inaderente, tumor pulmonar. Li-as com cuidado. […] Quanto mais lia, mais interessada ficava. Havia algo neste lugar e nestas histórias – tanto implicado quanto expresso – que me atraía, como, aliás, atrai centenas e milhares de pessoas de todas as partes da Terra. […] Quanto mais me aprofundei, achei os fatos tão impressivos e o quadro geral tão desafiador, que comecei a querer ver e estudar Lourdes pessoalmente. […] Parecia não haver uma história moderna em inglês, contendo fatos deste lugar e as coisas prodigiosas que ali acontecem. Eu quis escrever essa história. […] -Mas você não é católica! era a objeção imediata, sendo Lourdes célebre santuário católico.  Perguntei se aquilo não seria uma vantagem em vez de um empecilho. Personalidades católicas que consultei manifestaram que não seria má ideia ter um livro sobre Lourdes escrito por uma protestante. – Um moderno livro sobre Lourdes escrito por uma protestante – excelente! disse um jovial professor católico. Escreva-o, nós a ajudaremos no que for possível.”

Acompanhemos a narração do primeiro milagre de Lourdes pela pena de Ruth Cranston.

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            Um dos primeiros a abandonar seu ceticismo primitivo foi o próprio médico de Bernadete, Dr. Dozous. O Dr. Dozous era uma pessoa que dificilmente se esperava encontrar numa aldeiazinha montanhosa francesa no meio do século dezenove.

Quando surgiram os primeiros rumores sobre a jovem Soubirous, estava ele tão incrédulo como os outros da localidade. Mas Douzous era realmente um cientista e, antes de formar uma opinião, resolveu investigar.

Ele foi à Gruta com seu cronômetro – o único instrumento científico à mão de que dispunha – para observar Bernadete em suas visões. A beleza sobrenatural de seu rosto, durante aqueles períodos de êxtase, causou-lhe viva impressão.

Depois desta primeira experiência, continuou a ir lá vigiá-la diariamente. Cronometrou seus estados psicológicos e cuidadosamente anotou suas observações.

Seus trabalhos foram recompensados, pois enquanto a observava presenciou um dos primeiros milagres de Lourdes. Este se verificou em outro de seus pacientes, uma criança vizinha de Bernadete, Luís Justino Bouhohorts.

Luís Justino tinha dezoito meses. A mãe de Bernadete foi muitas vezes chamada por aquela mãe desesperada para auxiliá-la durante os terríveis ataques de que era vítima seu filho. O pobrezinho tinha uma doença que lhe paralisara completamente as pernas. O Dr. Douzous em suas notas sobre o caso dizia: – O diagnóstico vacila entre meningite e poliomielite.

O coitadinho não podia andar, ficar de pé ou sentar-se. Tinha convulsões violentas e febre alta com seríssimos ataques progressivos. O médico dizia: – É uma questão de horas.

A criança, no seu berço, gemia e respirava ofegante. A mãe tentava auxiliá-lo, porém o pai repelia: – Deixa-o. Não vês que agoniza?

Ele foi procurar uma vizinha para providenciar o enterro. Esta vizinha não demorou a chegar com a mortalha. Mas a mãe não desistia. Em dado momento, arrebatou a criança do berço, enrolou-a em seu avental e correu em direção à Gruta.

Encontrou a piscina que os operários tinham cavado alguns dias antes e naquela água gelada mergulhou o filho até a altura do pescoço por quinze minutos. Os vizinhos presenciaram a cena, boquiabertos. O Dr. Douzous, que lá estava com seu cronômetro observando Bernadete, contou também os minutos em que o menino da Senhora Bouhohorts ficou na água; quando ela o tirou da piscina estava rígido e azulado.

Sua mãe levou-o para casa e colocou-o novamente no berço. Ao vê-lo, o pai disse asperamente: – Como é, está feliz agora? Acabou de matá-lo?

A mãe ajoelhou-se e rezou ao lado da caminha. Após alguns instantes, puxou a manga do paletó do marido. – Veja, ele respira!

E a criança estava respirando, pausada e normalmente. Adormeceu e teve uma ótima noite. Na manhã seguinte sua mãe narrou que ele desjejuou bem e ela colocou-o de novo no leito enquanto arrumava a casa. Mais tarde, ouviu um barulhinho atrás de si, olhou e viu que era Luís Justino. Tinha saltado do berço e estava andando, cambaleando com o passo curto e incerto como é normal em qualquer criança daquela idade.

Naquele mesmo dia o Dr. Dozous e o Dr. Lecrampe o examinaram, o primeiro consultando suas anotações relativas ao caso. – “Examinei esta criança há três dias”, disse. “Nenhuma melhora então. Escrevi aqui: Paralisia da coxa. Dei-lhe doze horas de vida. Entretanto aqui está ele andando.”

– Sim, sim, vá a Lourdes, dizia o Professor Pitrès. – Você verá lá ótimos exemplos de autossugestão, com bastante flores, velas, incenso, preces coletivas, etc.

Mas para Luís Justino Bouhogorts não havia flores, nem cantos, nem preces, nem incenso. Só alguns curiosos mais ou menos céticos e um médico observador, e este era completamente descrente. – E tinha dezoito meses de idade. É possível que com dezoito meses se faça um ato de fé, ou seja, sujeito a autossugestão?

O caso do menino Bouhohorts calou fundo no Dr. Dozous. Foi uma das primeiras testemunhas médicas a presenciar um milagre em Lourdes e é considerado como o primeiro médico a trabalhar no estudo científico dos milagres.

Uma consequência interessante desta história. Luís Justino Bouhohorts, com a idade de setenta e sete anos, foi um dos convidados de honra na grande cerimônia da canonização de Santa Bernadete na cidade de Roma em 1933. Ele devia-lhe sua longa e sadia vida.

 

Fonte: Cranston, Ruth. O milagre de Lourdes. Trad. Ricardo Azzi. São Paulo: Melhoramentos, [1953], p. 21-23.