O Filho Pródigo

(“O filho pródigo” – vitral da Catedral de San Martin – Alsácia)

Neste quarto Domingo da Quaresma, ano C, a liturgia apresenta no Evangelho a parábola do Filho Pródigo. “Temos diante dos olhos uma das mais eloquentes páginas do Evangelho, considerada como a pérola de todas as parábolas. Ela é, de si, um pequeno Evangelho”[1].

Esta preciosidade foi-nos deixada unicamente pelo evangelista São Lucas. Médico e escritor, soube ele, com extrema sensibilidade e poesia, transmitir para os séculos a bondade e ternura de Deus, que é pai, em perdoar ao pecador arrependido, que é seu filho.

 A parábola

Nosso Senhor Jesus Cristo, diante de fariseus e escribas que o criticavam por receber os publicanos e pecadores, conta-lhes uma história: “Um homem tinha dois filhos. O filho mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me a parte da herança que me cabe’. E o pai dividiu os bens entre eles. Poucos dias depois, o filho mais novo juntou o que era seu e partiu para um lugar distante. E ali esbanjou tudo numa vida desenfreada. Quando tinha gasto tudo o que possuía, houve uma grande fome naquela região, e ele começou a passar necessidade. Então foi pedir trabalho a um homem do lugar, que o mandou para seu campo cuidar dos porcos. O rapaz queria matar a fome com a comida que os porcos comiam, mas nem isto lhe davam. Então caiu em si e disse: ‘Quantos empregados do meu pai têm pão com fartura, e eu aqui, morrendo de fome. Vou-me embora, vou voltar para meu pai e dizer-lhe: ‘Pai, pequei contra Deus e contra ti; já não mereço ser chamado teu filho. Trata-me como a um dos teus empregados’ ’. Então ele partiu e voltou para seu pai. Quando ainda estava longe, seu pai o avistou e sentiu compaixão. Correu-lhe ao encontro, abraçou-o, e cobriu-o de beijos. O filho, então, lhe disse: ‘Pai, pequei contra Deus e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse aos empregados: ‘Trazei depressa a melhor túnica para vestir meu filho. E colocai um anel no seu dedo e sandálias nos pés. Trazei um novilho gordo e matai-o. Vamos fazer um banquete. Porque este meu filho estava morto e tornou a viver; estava perdido e foi encontrado’. E começaram a festa.

O filho mais velho estava no campo. Ao voltar, já perto de casa, ouviu música e barulho de dança. Então chamou um dos criados e perguntou o que estava acontecendo. O criado respondeu: ‘É teu irmão que voltou. Teu pai matou o novilho gordo, porque o recuperou com saúde’. Mas ele ficou com raiva e não queria entrar. O pai, saindo, insistia com ele. Ele, porém, respondeu ao pai: ‘Eu trabalho para ti há tantos anos, jamais desobedeci a qualquer ordem tua. E tu nunca me deste um cabrito para eu festejar com meus amigos. Quando chegou esse teu filho, que esbanjou teus bens com prostitutas, matas para ele o novilho cevado’. Então o pai lhe disse: ‘Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Mas era preciso festejar e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e tornou a viver; estava perdido, e foi encontrado’” (Lc 15, 11-32).

 Aplicação

Não há dúvida que na parábola o pai representa Deus, sempre pronto e disposto a perdoar. O filho mais novo, esbanjador, que pede a parte da herança que lhe cabe figura o homem que ofende gravemente a Deus, desobedecendo voluntariamente seus mandamentos. O filho mais velho simboliza o homem aparentemente fiel, que se mantém na “casa do pai”, mas que não lhe entregou o coração, por isso age com soberba, inveja e ira quando do retorno do irmão esbanjador.

Longe da casa do Pai, ou seja, afastado da graça santificante o homem pode decair até chegar às “bolotas dos porcos” e, por quantas vezes, é nesta hora que, tocado pela graça de Deus, se dá conta do erro cometido e resolve voltar. Essa é a situação de todo aquele que se apresenta no confessionário em busca do perdão.

Ao avistar o filho que volta o pai corre-lhe ao encontro, “é a alegria do perdão de Deus, mediante os seus sacerdotes, quando por desgraça ofendemos o seu infinito amor e, arrependidos, voltamos para os seus braços de Pai”[2].

Por meio desta narração, quis Jesus mostrar àqueles que o repreendiam por acolher os publicanos e pecadores, que agiam como o filho mais velho, não aceitando a acolhida a estes transviados.

Conclusão

A caminhada quaresmal para a Páscoa do Senhor é um símbolo da caminhada para a páscoa pessoal e definitiva de todo ser humano, que necessita de uma continua “volta à casa do Pai” com a busca frequente do sacramento da reconciliação. “Digo-vos que haverá júbilo entre os anjos de Deus por um só pecador que se arrependa” (Lc 15, 10).

O filho pródigo arrependido ensina a postura de alma com a qual o penitente deve apresentar-se para a confissão: “Pai, pequei contra o Céu e contra ti”. Ele apresenta-se com sinceridade e humildade, sem justificativas. Agindo dessa forma é acolhido pelo pai, assim como o penitente é perdoado por Deus ao ouvir a fórmula da absolvição: Eu te absolvo dos teus pecados, em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo.


[1] CLÁ DIAS, João S. O inédito sobre os Evangelhos: Comentários aos Evangelhos dominicais – Ano C. Vol. V, p. 225.

[2] JOÃO PAULO II. Alocução a peregrinos napolitanos. Março/1979.