O monge e o ladrão

Conta-nos uma velha lenda, que havia em terras portuguesas um santo e piedoso monge. Vivia ele em continua oração e era muito estimado por todo o povo, que continuamente o procurava para lhe pedir orações.

Certa feita, aproximou-se do confessionário um temido e conhecido ladrão, que ao saber da virtude do monge resolvera lhe fazer uma proposta, dizendo:

– Todo o povo costuma dizer que alcançais especiais graças para todos por meio de vossas orações, por isso aqui estou para lhe solicitar que reze por mim, a fim de que mude de vida. Se não perceber em mim os efeitos de vossas orações voltarei em dois meses para vos matar.

Tendo feito sua infeliz proposta partiu, voltando à suas ímpias práticas.

Retornou algumas vezes dizendo:

– Não estais rezando por mim. Por isso terei de matar-vos.

Após muitas ameaças o bandido resolvera cumprir sua promessa e apresentou-se ao monge com o intuito de mata-lo.

O monge, ao vê-lo, entendeu prontamente do que se tratava, mas pediu ao ladrão a oportunidade de ver atendido um último desejo:

– Já que irei morrer, peço-lhe que me enterre em uma sepultura preparada por mim, assim não tereis a necessidade de cavar minha cova.

O ladrão assentiu e os dois se dirigiram ao cemitério do mosteiro. Chegando lá o monge pediu ao bandido que o ajudasse a mover a grande pedra que tampava o sepulcro. Este aceitou e começo a tentar arrastar a pedra. Empurrava, puxava fazia todo o esforço e via que a pedra não se movia. O ladrão então notou que o monge não só não lhe ajudava, mas oferecia resistência colocando-se sobre a pedra. Indignado, exclamou:

– Como poderei erguer a pedra se não me ajudais? Ainda que fizesse todo o esforço não conseguiria, uma vez que o senhor faz o esforço contrário!

Sem deixar que continuasse o monge o interrompeu.

– Vê irmão, lhe digo o mesmo. De quê me adianta rogar aos céus por ti, pedindo a Deus que lhe tire dos pecados se tu não te queres tirar desta situação, mas ao contrario estás determinado a perseverar no mau?

 

Muitas vezes agimos assim em relação a Deus, elevando-lhe constantes pedidos e quase que o obrigando a nos converter, mas no fundo de nossas almas não estamos em nada dispostos a renegar os maus costumes que levamos conosco.

Portanto, para que uma oração seja atendida é necessário, além de nossos pedidos, o esforço e o firme propósito de melhorar e corrigir nossos problemas, cooperando com a graça de Deus, pois esta, nunca nos falta.

 

*Conto tradicional do povo português, Theophilo Braga, vol. 2. Porto: Magalhães e Moniz.